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Sucessão familiar e relações de poder entre Homens e MulheresSucessão familiar. O poder nas relações homem e mulher.
“A grande conquista da modernidade é abraçar o vazio. Festejo? Definitivamente não. Nossos tempos modernos carecem é de reflexão.” (Gambini, em Luigi Zoja, 2000, p.ix).
A crise de identidade na pós-modernidade
O conceito de identidade é bastante controverso tanto nas ciências sociais quanto na psicologia e tem se modificado ao longo do tempo, mostrando-se especialmente sensível às transformações sociais.
No Iluminismo a noção de sujeito refletia o individualismo e a cultura patriarcal daquele período. A identidade era uma bagagem que acompanhava o sujeito desde que nascia e com ele permanecia. A identidade era o centro essencial do eu. Essa concepção antecedeu a noção de “sujeito sociológico” do mundo moderno, segundo a qual, “a identidade é formada na “interação” entre o eu e a sociedade.” (Hall, 2006, p.11. Caiu por terra a noção de um sujeito unificado Iluminista para dar lugar à noção de um sujeito inserido em uma cultura. No Modernismo, são inauguradas novas noções de sujeito e de identidade. Cai por terra a idéia de uma essência universal do homem e, com ela, o conceito de sujeito cartesiano. O homem racional, agora diante da descoberta do inconsciente, percebe que seus desejos e idealizações têm como base processos psíquicos e simbólicos e, portanto, que a subjetividade é também resultado de processos psíquicos inconscientes. Hall (Hall, 1922 p. 41) assinala a importância da psicanálise para o entendimento dessa noção de identidade como algo instável. O homem está sempre à procura de sua integração e inteireza mas […] “ele é constantemente perturbado (pela diferença)”. Carl Jung com seu conceito de individuação, processo que acontece durante toda vida descreve a busca do sujeito de se tornar um indivíduo – indivisível, inteiro, uma unidade. Jung , 1980 p. 275-354
Segundo Hall, ao final do século XX surge o argumento de que ‘[…] as identidades modernas estão entrando em colapso.[…] As representações sociais que nos conferiam identidade estão se fragmentando [ … ] essas transformações estão também mudando nossas identidades pessoais. (Hall, 1992, p.9)
“Esta perda de um sentido de si estável é chamada , algumas vezes, de deslocamento ou descentração de sujeito. Esse duplo deslocamento – descentração dos indivíduos tanto de seu lugar no mundo social e cultural quanto de si mesmos- constitui uma “crise de identidade”para o indivíduo. Como observa o crítico cultural Kobena Mercer,”a identidade somente se torna uma questão quando está em crise, quando algo que se supõe como fixo, coerente e estável é deslocado pela experiência da dúvida e da incerteza” Mercer, 1990,p.43 ( Mercer apud Hall . 1992, p.9
Na pós-modernidade, com o desenvolvimento da psicologia, sociologia e psicanálise tivemos o enfraquecimento da idéia de identidade como algo fixo que pretende abranger a essência da pessoa e ancorar sua história de vida desde o primeiro momento de sua existência. Os processos de identificação por meio dos quais constituímos nossa identidade, tornaram-se tanto mais dinâmicos quanto complexos devido também à multiplicidade de “sistemas de significação e representação cultural”[1]. As sociedades pós-modernas têm por característica a mudança constante e se caracterizam pela diferença e multiplicidade de opções. “A identidade torna-se uma “celebração móvel” formada e transformada continuamente em relação às formas pelas quais somos representados ou interpelados nos sistemas culturais que nos rodeiam (Hall, op. cit., p.12, 13)
[…] Uma vez que a identidade muda de acordo com a forma como o sujeito é interpelado ou representado, a identificação não é automática, mas pode ser ganhada ou perdida. Ela tornou-se politizada. Esse processo é, às vezes, descrito como constituindo uma mudança de uma política de identidade (de classe) para uma política da diferença. (Hall, 2006, p., 21)
Ao final do século XX, assistiu-se a um processo social denominado por Stuart Hall como “descentração”. O homem contemporâneo teria perdido um sentido estável de si e de seu lugar, seja na sociedade como um todo ou em sua realidade cultural. Nesse contexto, entende-se que. […] ”as identidades modernas estão sendo “descentradas”[2], isto é , deslocadas ou fragmentadas”( Hall, op. cit p.8)
[…] “Esta perda de um “sentido de si” estável é chamada, algumas vezes, de deslocamento ou descentração do sujeito. […] A identidade somente se torna uma questão quando está em crise, quando algo que se supõe fixo, coerente e estável é deslocado pela experiência da dúvida e da incerteza.” ( Kobena Mercer apud Hall, 2006, P.9)
Com o rápido avanço tecnológico do século XXI, o sujeito viu sua identidade atrelar-se à pluralidade de opções instaladas pelo processo de globalização que estreitou distâncias e ampliou os recursos de comunicação. Podemos falar de múltiplas identidades ou de unidade na diversidade, substrato do conflito de identidade do homem contemporâneo. Esse conflito de identidade está presente nas relações afetivas na contemporaneidade e tem como pano de fundo a relação entre forças (competências e valores humanos) .
Transformação social e amor.
Entre as competências e valores humanos está o potencial para estabelecer vínculos e amar, ou seja, a capacidade do indivíduo de se associar a outros humanos. São muitas as definições e formas de se entender o amor, desde a capacidade do ser humano de estabelecer vínculos até a noção de caridade ou doação, presente no amor-cristão, o amor de dileção ou ágape.
Gilda Montoro, analista de casais e família, usa uma bela imagem para se referir à multiplicidade de formas existentes de entendimento do amor:
Do ponto de vista teórico, o termo amor equivale a uma floresta amazônica de conceitos e imagens[…] Pode ser definido como uma atitude, uma emoção, um sentimento e um conjunto de comportamentos. Pode ser visto também como uma orientação individual (a propriedade do indivíduo que ama) ou um vínculo entre duas ou mais pessoas. (Montoro et al 2010, p.5)
A palavra latina amor tem como significado afeição ou simpatia. Segundo Japiassú e Marcondes ((Japiassú e Marcondes, 1996, P.8) e o amor é “Inclinação para uma pessoa sob todas as suas formas e em todos os graus, desde o amor desejo (inclinação sexual) até o amor paixão e o amor sentimento”.
Entre as definições de amor está o amor ablativo que se opõe ao egoísmo e à relação possessiva e se caracteriza pela doação e dedicação ao outro. Conhecemos também essa forma de amor como o ágape ou de dileção descrito na Epístola do Apóstolo Paulo aos Corintios. É no capítulo 13 da Epístola que Paulo fala sobre o amor que, em algumas traduções, aparece como a palavra caridade:
[…] O Amor é paciente, é benigno; o Amor não é invejoso, não trata com leviandade, não se ensoberbece, não se porta com indecência, não busca os seus interesses, não se irrita, não suspeita mal, não folga com a injustiça, mas folga com a verdade. Tudo tolera, tudo crê, tudo espera e tudo suporta. O Amor nunca falha. (A Biblia de Jerusalém,,1989, I corintios 13, p.2165) ,
A transformação do amor como potência simbólica acompanha a história da Sociedade. Na Grécia Antiga e com o surgimento da moral cristã o amor ideal é visto isento do carnal e dos prazeres mais simples do homem e se atrela às noções de belo, de verdade e de virtude. Segundo Japiassú e Marcondes, “amor platônico é aquele que prescinde de toda sensibilidade para alegrar-se com as belezas intelectuais ou espirituais e com a essência mesma do belo”. (Platão apud Japiassú e Marcondes,1996, p.8).
Na Idade Média, as dissociações entre mente e corpo, sagrado e profano, identidade e amor, estavam na base dos relacionamentos. O casamento era sacramentado em uma estrutura patriarcal de bases feudais, em que a mulher passava da condição de propriedade da família e de seu pai para a reclusão no casamento indissolúvel sob a autoridade do marido. A mulher que não correspondesse às expectativas dos papéis sociais a ela designados era devolvida para o pai ou para o senhor feudal e, muitas vezes, tinha no convento a única saída. A moral cristã[3] fundamenta as bases desiguais da sociedade feudal A figura do senhor feudal, do marido e do divino estavam fundidas na consciência coletiva. Até o final século XVIII, o sexo era o dever conjugal a ser cumprido e os casamentos eram contratos sociais baseados mais nas relações de patrimônio do que nos laços afetivos entre os cônjuges. Com o surgimento do amor romântico, o afeto passou a ser o foco dos relacionamentos. Mas o amor era ainda idealizado e o sexo, incluído na fogueira das paixões a serem combatidas. As mudanças na concepção do amor acompanham a transformação da família cujas fases são bem definidas por Elisabeth Roudinesco.
“Podemos distinguir três grandes períodos na evolução da familia. Numa primeira fase, a família dita “tradicional’ serve acima de tudo para assegurar a transmissão de patrimônio [.…] Numa segunda fase a família dita ”moderna” torna-se receptáculo de uma lógica afetiva cujo modelo se impõe entre o final do século XVIII e meados do XX. Fundada no amor romântico, ela sanciona a reciprocidade dos sentimentos e os desejos carnais por intermédio do casamento […] Finalmente, a partir dos anos 1960, emerge a família “pós – moderna” que une, ao longo de uma duração relativa, dois indivíduos em busca de relações íntimas ou realização sexual”. ( Roudinesco, 2003, p.19)
Foi nessa segunda fase, da família dita “moderna” que a psicanálise introduziu a discussão sobre a dimensão simbólica das regras de filiação, de aliança e de relações entre irmãos, e do estabelecimento do vínculo amoroso. A partir dos estudos psicanalíticos rompeu-se o silêncio discriminatório em relação à importância da sexualidade e foi lançada luz sobre a importância do imaginário na construção da identidade. Entretanto, o principal mérito da noção de inconsciente proposta pela psicanálise, foi tirar da razão a primazia para o acesso às verdades humanas. Como salienta Roudinesco (Roudinesco, 2003, p.20), […] “a descrição literária da família – ou da vida das famílias – foi substituída, entre 1861 e 1871 por uma abordagem estrutural dos sistemas de parentesco”. Entendo essa abordagens não como excludentes mas sim como complementares. Os dados da história de uma família, o estudo dos mitos, das várias formas de poder dentro da família, assim como das estruturas de parentesco podem nos auxiliar na análise das relações e dos papéis dentro da família.
Identidade, amor e poder
O psiquiatra suíço Jung[4] lançou o foco de suas reflexões na base arquetípica e na multiplicidade de fatores presentes na construção da identidade. A concepção de Jung sobre o feminino correspondia a sua condição de homem em uma sociedade por ele reconhecida como de consciência predominantemente patriarcal. Entre os potenciais arquetípicos presentes no funcionamento psicológico, propõe um princípio masculino (Logos) que designa racionalidade, lógica e interesse pelo objeto e o outro feminino (Eros), a capacidade para unir-se e relacionar-se. Falava em termos simbólicos, então, Eros e Logos existem em ambos os sexos e tem o mesmo valor psicológico na concepção de Jung. Porém, quando se liga Eros e Logos ao gênero pode-se cair em alguns preconceitos. Como, por exemplo, o de que as mulheres teriam menor capacidade para pensar racionalmente (falta de exercício do Logos) ou que faltasse aos homens, em geral, inteligência emocional (falta de exercício do Eros).
Magali Engel ( in Mary del Priori (org) et al , 2010,p.332 ) reflete sobre a construção da imagem feminina na civilização ocidental e principalmente na sociedade brasileira. A autora reflete sobre a imagem do feminino do século XIX que associ a mulher à natureza, enquanto o homem é associado à cultura o que implicava em […] “em qualificar a mulher como naturalmente frágil, bonita, sedutora, submissa , doce, etc.” Esses atributos dirigidos à mulher fundamentavam a idéia da figura feminina como ambígua e justificavam a exclusão da população feminina da participação na sociedade como um todo, lhe reservavam como papel social o lugar de esposa e mãe. A mulher que não se adequasse a esse perfil era identificada com […] qualidades negativas – como a perfídia e a amoralidade .
Segundo Samuels, analista pós–junguiano, (Samuels,1989, p..251) se entendermos que Jung usa uma linguagem simbólica para falar sobre o feminino e o masculino entenderemos que representa a dicotomia básica do funcionamento psicológico humano a partir da sizígia homem e mulher. Jung considerava a presença de opostos na psique humana sem atribuir uma hierarquia ao masculino ou feminino que são arquetípicos. Entendo que esses potenciais arquetípicos se diferenciam e se transformam nos papéis sociais e que as relações de gênero, culturalmente estabelecidas, contém polaridades e contrastes que podem se exercer de forma complementar ou não. Podemos, então, considerar a existência de potenciais masculinos e femininos nas psiques do homem e da mulher que podem estar mais ou menos acessíveis à consciência. Uma reflexão sobre as questões de gênero deve levar em consideração os valores e papéis sociais em uma sociedade. Da mesma forma, é necessário separar diferenças sexuais (sexo) de papéis sexuais culturalmente desenvolvidos (gênero).
“Mesmo se existisse algo absolutamente masculino ou absolutamente feminino, não é necessário que os homens tenham maior parcela do primeiro e as mulheres, do segundo [..] nem tudo que parece ser masculino já está na consciência dos homens; nem tudo o que parece ser feminino está presente na consciência da mulher. Temos que falar em termos de potenciais variados que ainda não estão disponíveis.” ( Samuels ,1989, p. 257)
Carlos Byington, psiquiatra e analista brasileiro, aplica seu conceito de bipolaridade simbólica para o entendimento do masculino e feminino e critica a inserção dos conceitos junguianos de anima ( contraparte sexual feminina presente no inconsciente do homem) e animus( contraparte sexual masculina no inconsciente da mulher) com a mesma equivalência na personalidade dos homens e mulheres.
[…] para ultrapassar a concepção unilateral de Jung dos arquétipos da anima e animus, prefiro a concepção bipolar, inclusive masculino e feminino desses arquétipos. Com isso, ultrapassa-se a unilateralidade, e mantém-se a diferença arquetípica do homem (anima) e a mulher (animus), como almejou Jung”. (Byington,1988, p.48)
Entendo que o predomínio da associação de algumas imagens ao masculino, pode simbolizar o que uma sociedade e cultura valorizam (consciência coletiva), o que é hegemônico em uma cultura, e expressa antes de tudo as representações sociais relativas ao que vem a ser homem e o que vem a ser mulher naquela sociedade. Acrescento a necessidade de maior parcimônia ao se refletir sobre a identidade de homens e mulheres dada a complexidade de fatores envolvidos no tema.
No século XIX, os atributos conferidos às mulheres de fragilidade física, intelectual e emocional foram o ponto de partida para o modelo de feminino que acompanhou os primeiros estudos psicanalíticos. O argumento que apontava para a natureza frágil das mulheres contra o poder, a coragem e a força dos homens, baseava-se na idéia de um frágil logos feminino, sugerindo um padrão de submissão à liderança e desejo masculinos.
“Para Jung a psique moderna apresenta-se fragmentada de seu potencial, dominada por uma consciência altamente racional e tende a projeção de seus conteúdos inconscientes que são negados pela cultura dominante. Este estilo dominante da consciência foi reconhecido por Jung como sendo distintamente masculino e determinante para a ascensão da cultura patriarcal nos últimos dois milênios, uma idéia que o levou, de forma complementar, a estabelecer os aspectos negados como femininos.” (Hauke, 2003, p.126)
Autores da psicologia analítica refletem na atualidade sobre a sombra coletiva e, mais especìficamente, sobre aspectos sombrios da identidade masculina. Apontam para um possível sentimento inconsciente de inferioridade e de inadequação do homem no mundo contemporâneo, assim como para um prejudicado sentido de si mesmo.
Ao contrário de ser capaz de relaxar com um sentido consciente de superioridade, ele, o homem contemporâneo sofreria de um sentimento de inadequação frente ao maternal e o criativo. Dessa maneira, ele se vê incapaz de promover vida, abrigar e se relacionar efetivamente e empàticamente tanto com homens como com mulheres. A anima, embora projetada, nesse contexto seria melhor entendida, como um incompleto e prejudicado sentido de self. (Pederson apud Hauke, 2003, p.126)
A ênfase na idéia de que o homem necessita da mulher como depositário da sombra do seu feminino deixa de lado outras questões: a fragilização do masculino na cultura e o fortalecimento da representação social da mulher na contemporaneidade. Para o entendimento dos conflitos de identidade do homem e da mulher na contemporaneidade devemos lançar o foco de reflexão nas diferenças do ponto de vista psicológico, levando em consideração cada realidade sócio–cultural, a pluralidade de posições ou possibilidades de parcerias entre os gêneros, que inclui também a percepção difusa, o não saber, o subjetivo, o saber como processo e sempre em construção.
A partir do Século XX, com o desenvolvimento da psicologia e da psicanálise, surge a proposta de um novo modelo de parceria amorosa que deve levar em consideração a arte de dar e receber em maior simetria, que valoriza a identidade de cada um dos parceiros e se separa da modelo patriarcal de relacionamento, baseado na diferença de poder e no domínio de um parceiro sobre o outro como garantia de identidade. Ainda assim, até os anos 1950, o modelo patriarcal de união favorecia a representação da própria individualidade através de uma vivência de fusão com os feitos do companheiro, por parte das mulheres. O exercício da autonomia aparecia como transgressão ao vínculo.
As mudanças na concepção dos papéis masculino e feminino na família e na sociedade deram origem aos estudos de gênero. Nos anos 1960, caiu por terra o lugar de chefe de família antes protagonizado, em sua maioria, pelo homem. O movimento feminista traz para a consciência coletiva a desigualdade de direitos entre os gêneros. Mas o grande mérito do movimento das minorias foi a conquista do direito à participação política e social e o respeito à diversidade. Desses movimentos, extraiu-se a noção de que “os mínimos aspectos da vida pessoal estão articulados às relações de poder mais amplas.” (Nolasco, 2001, p.280)
No entanto, os estudos de gênero que sofreram a influência do movimento feminista, deram ênfase à díade dos sujeitos empíricos, homem versus mulher, sem que se desse a devida atenção à construção da representação social masculina. Essa visão parcial considerava o patriarcado um sistema opressivo somente contra a mulher, ignorando os danos operados pelo mesmo sistema à população masculina. E sendo gênero (Nolasco, 2001, p.96) […] “uma categoria simbólica que representa um contínuo entre as representações masculinas e femininas, […] não há uma polarização a priori”. O mérito do estudos de gênero foi lançar foco sobre a desigualdade de direitos entre homens e mulheres e refletir sobre a hipótese de que as relações entre os sexos se dão como relações de poder.
Estudo sobre violência entre homens e mulheres e o papel do judiciário na solução dos conflitos de gênero (Izumino, 2004) confronta o imaginário do casamento na sociedade brasileira e os papéis sociais masculino e feminino. A autora, procura “apresentar as agressões da perspectiva daqueles que as protagonizaram, interpretando-os como relações de poder, portanto como relações que evidenciam diferentes interesses em jogo.” O estudo (Izumino, 2004, p.267) lança foco na necessidade de uma crítica ao uso dos modelos de comportamento socialmente determinados como única referência no julgamento de crimes de violência entre os gêneros.
“Em relação aos casos que envolvem conflito de gênero, os papéis sociais são sempre referenciados à família e casamento (Corrêa, 1983)[5] e aos aspectos definidores desses papéis sociais nessas instâncias: a sexualidade feminina e o trabalho masculino.” ( Pasinato, W 2004 , p. 268
Na contemporaneidade, embora se constate a existência de várias formas de conjugalidade, inclusive com reconhecimento pela lei, para uma reflexão ética prevalece na consciência coletiva o modelo de comportamento ligado à preservação da família muitas vezes em detrimento das identidades dos parceiros.
De outro lado, uma nova ética se inaugura com o fenômeno da globalização, a do “Amor líquido”, conceito de Baumann. (Baumann, 2004) Para o autor, o amor na contemporaneidade, está incluído nos mecanismos da sociedade de consumo. Comenta sobre o “Guia matrimonial de Londres”, que apresenta duas regras principais a um relacionamento que ele chama “de bolso”:
”de bolso, sem dúvida, já que é você e só você que está no controle, e nele permanece por toda a vida curta dessa relação […] “deve-se entrar no relacionamento plenamente consciente e totalmente sóbrio […] mantenha-o do jeito que é. Lembre-se de que não é preciso muito tempo para que a conveniência se converta no seu oposto” ( Baumann, 2004, p. 37) .
O desapego, assim como a perspectiva da vida como um eterno recomeço ocultam a insegurança e a incerteza do futuro. Relacionar-se com liberdade se afasta do conceito de intimidade na sociedade contemporânea. Ter múltiplos parceiros em um mundo globalizado onde a identidade é questionada todo momento, passa a representar uma oportunidade de viver algo novo e original, através da possibilidade de transgredir padrões habituais de conduta e a estrutura de poder vigente, buscando novas alternativas. Junto a esses tentativas de transgressão do status quo, observo na prática clínica e da mediação familiar, que a busca do respeito à individualidade e resgate da identidade é hoje um desejo inconsciente presente nos casais que buscam uma relação baseada na valorização de si e do outro. Mas, para que esses objetivos sejam atingidos, os parceiros devem se confrontar com a sombra coletiva que abriga os conflitos relacionados às relações de poder. Apesar das transformações do século XX, ainda não podemos afirmar o triunfo das relações igualitárias entre os gêneros.
Segundo Sócrates Nolasco (Nolasco, 2001) um dos fatores de conflito entre homens e mulheres na contemporaneidade é a mudança ocorrida nas representações sociais da identidade masculina. Segundo o autor, estudos etnográficos demonstram que a masculinidade, em diferentes culturas, tem seu reconhecimento pelo grupo a partir da exigência de que o sujeito seja um provedor mesmo que a mulher contribua no sustento e no bem-estar de sua família. Ainda que seja provedor e bom pai, é preciso que realize algo que considere de especial esforço, ou de talento heróico, para que se sinta seguro quanto a sua identidade masculina. A violência do homem, é para o autor, tentativa de resgate da auto-estima da população masculina que se vê privada das representações sociais que anteriormente asseguravam sua identidade na sociedade patriarcal, como por exemplo, o lugar de provedor e de chefe de família.
A masculinidade é uma experiência coletiva desenvolvida por intermédio de ritos, testes e provas concebidos para o sujeito responder pùblicamente se ele é ou não é um homem. No ocidente, a masculinidade não vem facilmente; ela é conquistada através de muito esforço, existindo entre a representação masculina e a violência uma estreita relação, uma vez que brigar é uma forma do sujeito defender sua imagem de homem. (Nolasco, 2001, p.104)
Verifico na prática clínica e no atendimento em mediação a vítimas de violência na familia que grande parte da população dos homens desenvolveu a auto-estima dando ênfase às conquistas no trabalho em detrimento das relações afetivas. Dessa maneira, excluíram-se do domínio da intimidade do lar. Esse fator agravou a crise de identidade masculina mediante a grande concorrência no mundo globalizado, em que as oportunidades de destaque profissional requerem mais esforço, sem garantia de compensação. De outro lado, concorrem com as mulheres que ocupam hoje lugares no mercado profissional, anteriormente restritos aos homens. Em análise individual, de casal e mediação familiar observo as disputas de poder como um fator de conflito entre os parceiros. Essas disputas interferem nos níveis de investimento, generosidade, permissividade, solidariedade, aceitação de diferenças e ideais de satisfação.
A autonomia das mulheres é vivida por alguns homens como abandono e não acolhimento afetivo. Estão se confrontando com uma imago de mulher muito poderosa que, no imaginário masculino, não necessita de seu afeto, tampouco de sua proteção. Nessa perspectiva, a competência da mulher é vivida como ameaça à identidade do homem. De outro lado, essa mesma mulher que conquistou seu direito à cidadania parece não legitimar suas conquistas. Ainda não deitou as armas, que considera necessárias diante do sentimento de ameaça de perda do que conquistou. Ainda apegada ao modelo patriarcal e ao ideal de amor romântico, vive o conflito de necessidade de afirmação de sua autoridade e competência versus o desejo de ser cuidada pelo homem no modelo de dependência. Desse conflito, o fato de mulheres vítimas de agressão por parte do companheiro retroagirem na queixa feita na delegacia ao se confrontarem no processo judicial com a possibilidade de ficarem sem o suposto amparo do companheiro, mesmo que esse não esteja contribuindo nem financeiramente e nem dispensado cuidados afetivos à família.[6]
Um dos comportamentos observados na população feminina é ora de uma cobrança de cuidados ao companheiro, dos quais nem ela acredita depender, ora de comportamento fóbico em relação ao cuidado do companheiro, que associado no su imaginário, ao poder patriarcal, é vivido como ameaça à sua identidade. Ao simular essa situação de dependência e negar as diferenças, tenta estabelecer um padrão incestuoso de relacionamento para escapar aos conflitos de poder. Nesse padrão incestuoso observa-se certo mimetismo: mulheres que procuram imitar o estilo masculino de realização o que prejudica a sua identidade como mulher. De outra feita, a fobia da mulher à situação de submissão ao poder masculino interfere na espontaneidade da expressão de seus afetos no relacionamento. A expressão do ressentimento da mulher aparece na forma de sonegação de cuidado, abandono afetivo e crítica verbal, o que contribui para a baixa auto-estima do homem. A queixa de muitas mulheres é a de que são abandonadas afetivamente por seus companheiros que se sentem impotentes diante da autonomia feminina. A mulher, no afã de neutralizar as diferenças, vive um efeito paradoxal, na forma de crise de identidade.
[…] a “nova” representação feminina está privada do masculino, e, portanto, destituída da ilusão vital do Outro, e assim também de sua própria ilusão, de seu desejo e do privilégio de ser mulher. (Nolasco, op. cit. p.186)
Outro fato é o conflito de autoridade e agressividade entre os casais . Mulheres queixam-se de abandono por parte dos homens que competem com sua autonomia. Homens são vítimas de desqualificação por parte das mulheres e a impotência de ambos emerge como sintoma desses conflitos. Como solução mágica para os conflitos, a busca de uma relação paralela, o uso abusivo de substâncias farmacêuticas de combate à impotência sexual, assim como o abuso de substâncias em geral, contribuem para esse cenário vendendo a idéia de que podem ter controle absoluto sobre suas emoções e banir o conflito. Esse mal entendido deixa de considerar a interação humana e o conflito como fatores de transformação psíquica e que o poder legítimo do sujeito está no respeito à identidade do outro e no exercício da própria identidade.
Bourdieu reflete sobre o amor e as relações de dominação. O autor se afasta de uma concepção idealizada das relações e conecta amor e poder em uma polaridade dialética, onde a capacidade de amar se desenvolve no exercício do sacrifício do desejo de dominar. Permanece, porem, a questão: Sendo a sombra do amor o desejo de dominação, “seria o amor uma exceção, a única, mas de primeira grandeza, à lei da dominação masculina, uma suspensão da violência simbólica, ou a forma suprema, porque a mais sutil dessa violência? (Bordieu,2010,p.129)
O autor (Bourdieu, 2010 p.130) contrapõe às relações de dominação, de luta e de guerra, ao amor, uma[…] “espécie de trégua milagrosa” em que a dominação parece dominada”. O amor aparece como adversário do impulso do ser humano de dominar e […] “o sujeito amoroso só pode obter o reconhecimento de um outro sujeito, mas que abdique, como ele o fez, da intenção de dominar”.
Sucessão familiar e conflitos de poder.
Hoje, o lado sombrio das relações entre homens e mulheres é o conflito de identidade, dinâmica que está na origem das disputas de poder. Apesar das conquistas de igualdade de direitos entre os gêneros e da mudança da predominância de um eixo vertical para um eixo horizontal das identificações, não podemos deixar de considerar que as disputas de poder perpassam as relações de gênero na contemporaneidade. Essas disputas se expressam principalmente em sentimento de desamparo e pela ameaça da perda do sentido de identidade.
O sujeito da industrialização se caracterizou pelo eixo vertical das identificações hierárquicas presentes na estrutura patriarcal da sociedade industrial, enquanto o sujeito contemporâneo é marcado pelo caráter volátil e transitório dos seus ideais e das representações que lhe conferem identidade. Essas mudanças estruturais, tais como o caráter líquido das relações na sociedade globalizada (Baumann, 2004) e os conflitos de identidade contemporâneos potencializam o ideal de satisfação, a idealização de si e do outro, que se traduz em ansiedade e exigência nos relacionamentos. A valorização extrema da autonomia individual resulta de um lado em racionalidade que propõe o controle dos sentidos e, de outro, de forma compensatória em extrema idealização das relações e imediatismo na satisfação de desejos em detrimento das necessidades do outro.
No atendimento a casais em análise e mediação familiar, observo que a família contemporânea apresenta feridas íntimas, relacionadas ao enfraquecimento da figura masculina que vive conflito de auto-estima, com o enfraquecimento do poder patriarcal desde o final do século XIX. A queda do poder e do princípio de autoridade representado anteriormente na figura do pai se extende também às relações entre pares nas organizações, assim como a outras […] “referências patriárquicas desafetadas”, termo de Burguiére, que são o exército, a Igreja, a nação, a pátria, o partido”. (André Burguiére apud Roudinesco, 2003, p.199).
Um processo sucessório que na família burguesa do século XIX deveria se dar segundo critérios da hierarquia patriarcal, hoje se vê transformado pelos novos padrões de relacionamento na família e na sociedade. A visão sistêmica das relações familiares põe em foco a interação entre o sujeito e a rede de relações que tende cada vez mais a se horizontalizar no que se refere ao exercício da autoridade na família. O foco da psicologia e mediação familiar passa a ser a garantia da identidade dos sujeitos em meio à multiplicidade de opções, levando em conta as diferenças e o potencial individual de desenvolvimento. O modelo de família e a ordem política tem tido influência também nas “correntes doutrinárias do direito” que interpretam de formas diversas essas mudanças e tem acompanhado o processo histórico.
Na sociedade tradicional brasileira, a família patriarcal teve diferentes formatos que, segundo Koerner, podem ser entendidos como ”o nome de um dispositivo, estratégia, processo, relação de poder, para implantar a disciplina cristã entre os povos da colônia”. O autor destaca que as famílias extensas de tipo patriarcal não foram a maioria e que “A organização familiar variava segundo as classes sociais, havia mulheres como chefes de família, adultérios confessados, concubinatos, bigamia”.(Koerner, 2002 em Lia Fukui et al p.74).
No Brasil Imperial, adotava-se a referência da “organização familiar mononuclear burguesa” onde o poder do pai tinha primazia legal. Por outro lado, as diferentes modalidades de relacionamento presentes nas relações concretas, gerava, segundo o autor, a necessidade de uma prática jurídica que ”não adotava o modelo oficial tout court mas procurava adaptá-lo à diversidade de situações que ingressava em juízo.” (Koerner), 2002 , op. cit. P.77)[7]
A pluralidade de formas sociais de organização familiar permanece na República em uma combinação com a unidade legal do modelo de família. Permanece em vigor, segundo Koerner, “[…] o modelo de família monogâmica constituída pelo casamento e com suas relações ordenadas segundo critérios de hierarquia e de diferenciação funcional entre os cônjuges”. Com a constituição de 1988, uma pluralidade de modelos de família é incluída no palco das negociações jurídicas. Os aspectos psicológicos passam a ser levados em consideração na busca de soluções jurídicas relativas ao direito de família e o direito de sucessões. A familia monoparental e a união estável são reconhecidas e equiparados os direitos do homem e da mulher na sociedade conjugal. Cai também a distinção dos filhos em virtude do casamento ou não. (Koerner, 2002, p.96).
O legado dessas transformações no direito e nas teorias psicológicas sobre a família é a possibilidade da mediação dos conflitos em processos judiciais no direito de família e direito sucessório. Roberta Nioac Prado lança o foco nas diferenças e nas questões psicológicas envolvidas em processos de sucessão em empresas familiares.
Os advogados processualistas, em geral, preocupam-se apenas com temas jurídicos, esquecendo-se o quanto uma empresa familiar é suscetível a questões psicológicas e aos relacionamentos de seus sucessores. […]Especialmente quando se trata do assessoramento jurídico- sucessório para uma empresa familiar ou uma família empresária, há que se ter em mente que o futuro da empresa é extremamente vulnerável aos ânimos da família que, em inúmeros casos, conta com membros donos de personalidades marcadamente distintas.( Prado, 2011.p.71)
Além das diferenças de personalidade, os conflitos de poder dentro da família, advindos das questões aqui levantadas: a pluralidade de formas de parceria entre homens e mulheres, o processo de adaptação de homens e mulheres aos novos papéis sociais e representações sociais atribuídos aos gêneros pelas mudanças sociais e políticas, as mudanças jurídicas ocorridas no direito de família e no direito societário, os novos parâmetros e paradigmas de compreensão psicológica das relações dentro da família, perpassam as negociações e devem ser levados em consideração.
Não me ative aqui a aprofundar os tipos de conflitos encontrados nos processos de mediação entre homens e mulheres nas várias modalidades de parceria conjugal. Mas procurei levantar alguns fatores de conflito. Um aspecto a ser lembrado é o da responsabilidade ética e social dos que atuam nessa área da interdisciplinaridade entre o jurídico e o psicológico, em que a lei e as medidas tomadas devem ser a expressão das necessidades e características também dos envolvidos nos processos a serem conduzidos e não apenas a adequação dos sujeitos às expectativas dos padrões sociais de conduta. Cabe acrescentar que cabe ao mediado não a proposta de uma solução para o conflito mas facilitar o processo de decisão cuja a escolha pertence às partes envolvidas.
Referências bibliográficas
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[1]“Sistemas de significação e representação cultural”, termo de Hall ao se referir às formas como atribuímos sentido e nos fazemos reconhecer e buscamos ter uma identidade em uma sociedade.
[2]. Hall se opõe a um sentido fixo de identidade tal como a concepção iluminista de sujeito.(Hall, op.cit, p.10)
[3] Ler mais sobre o tema em (Arendt H, 2008 )
[4] Ver mais sobre o tema em Jung Carl (1979), CW,, v. 9,I , The Archetipes and the Collective Uncouncious, Bollingen Series XX , Princeton, 1979
[5] Ver mais sobre o tema em Corrêa, M.1983. Morte em família, Representação jurídica de papéis sociais, São Paulo: Graal
[6] Ver mais sobre o tema em Izumimo,P.Wânia Justiça e violência contra a mulher- O papel do sistema judiciário na solução dos conflitos de gênero.-2ª- edição, São Paulo: Annablume; Fapesp, 2004.
[7] A prática judicial deveria programar as condutas e refletir o sistema de normas no interior desse modelo. O pensamento e a técnica jurídicos propugnavam uma prática judicial formalista. Assim a regra sobre a guarda dos filhos era simples dedução do pátrio poder: Os filhos ficavam sob a guarda do pai. Se fossem menores de três anos seriam cuidados pela mãe, mas o pai continuava com o pátrio poder, e a ele cabia prover o seu sustento […]se a mãe falecesse, cabia ao pai a administração e usofruto dos bens herdados pelo filho, até a maioridade deste, a qual , no entanto, não era alcançada pela idade legal, mas pelo casamento, pela emancipação ou pela fixação, pelo filho de residência e de meios próprios de subsistência. Com isso, excluíam-se do campo jurídico os conflitos entre pais e filhos, atribuindo-se ao pai a proeminência legal ou indicando-se que, nos casos duvidosos, deveriam prevalecer a vontade e os interesses do pai.”(Koerner, op. cit p.75).